Daniel Danguy – “Sobre a transcendência dos condicionamentos nas relações”

Daniel Danguy – “Sobre a transcendência dos condicionamentos nas relações”

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Nós somos por natureza interdependentes. Interligados pelo corpo, mente e fala, com todos os seres. A nossa vida veio da união dos nossos pais. Então, o que acreditamos e falamos é, de certa maneira, uma reprodução do que a cultura oferece.
No entanto, achamos que somos entidades sólidas, fixas, permanentes. Pensamos que temos um “eu” imutável, mas esse “eu” está em constante atualização através de pensamentos automáticos, crenças e apego ao nosso corpo.
O que isso tem a ver com os nossos relacionamentos e a nossa sabedoria ao lidar com o outro?
Tudo. Ao ignorarmos que não somos tão sólidos assim, imputamos solidez aos outros e os reduzimos a um objeto. Consequentemente, passamos a lidar apenas com a faceta que se apresenta para nós. 
Por exemplo, pensemos em uma filha que não se dá bem com a mãe devido ao jeito invasivo dela, passa anos reproduzindo em sua mente que a sua mãe é aquela pessoa invasiva e costura a imagem dela à aversão, a uma raiva constante. Depois, acaba se esquecendo disso e passa a se irritar muito facilmente com certas pessoas que ativam a lembrança de sua mãe. Por outro lado, a mãe também enxergava a filha como uma “entidade” incapaz e não merecedora de privacidade. Ambas as visões estáticas vão se sustentando. 
Então, primeiramente, precisamos reconhecer que temos conteúdos na nossa identidade que vieram de fora, de concepções, de pessoas, de crenças. A identidade é um composto dos pais, dos irmãos, dos amigos, das pessoas que admira e das que não consegue gostar. 
Mas o que eu faço com isso? Como saber quem eu sou e o que me diferencia dos outros?
Na medida que tomamos consciência das nossas histórias, dos papéis que vivemos, dos nossos apegos e aversões, podemos tomar atitude frente a eles. Não ficamos tão à mercê dos nossos condicionamentos e, assim, temos a liberdade de soltar o controle sobre o outro.
Para ficar mais claro: Depois que a filha percebeu os seus condicionamentos, refletiu sobre a história e as verdades da sua mãe influenciaram em suas verdades, ela não fica mais tão irritada assim, nem controlada pela sua raiva. Não quer dizer que ela não se lembrará, não sentirá aversão. Isso é com o tempo… Mas ela vai ter outra percepção. Quando ela tomou consciência daquele padrão, ela viu o quanto sua mente ficava rígida, enxergando a sua mãe como uma “coisa” invasiva. Assim, transformou a sua mente e seu comportamento, em relação a ela, abrindo, também um espaço para a transformação de sua mãe.
Se aceitamos o que o outro, a cultura, os nossos pais ofereceram para o nosso senso de identidade, ficamos abertos para o reconhecimento de que todas as coisas são plásticas, são vazias. Elas não têm uma natureza absoluta.
Para finalizar, compartilho com vocês um fragmento que recebi de um ensinamento em um retiro de budismo: Perguntaram para a professora o que é iluminação. Ela falou que a iluminação é algo muito difícil de se colocar em palavras. Se tentarmos, reforçaremos a natureza ilusória dos fenômenos (as crenças e os hábitos de acharmos que as coisas têm natureza fixa, parada, verdadeiramente existente).
Mas ela afirmou que é possível termos vislumbres sobre a iluminação, já que nossa própria natureza é iluminada desde tempos sem princípios.
O vislumbre é quando temos consciência de um hábito negativo e escolhemos não o repetir: como a tendência de sempre comer todo o bolo de chocolate e esquecer que os outros também querem. No momento em que estou indo pegar esse último pedaço e lembro que talvez o meu querido colega também queira desfrutar do que restou do bolo e, assim, resolvo deixar para ele, isso é iluminação.
Espero que essa reflexão tenha feito sentido para você.
Um grande abraço,
Daniel Danguy

Autor: Daniel Danguy
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